sábado, 19 de junho de 2010

de Nampula a Dar es Salaam, Tanzania

Inesperadamente a cidade de Nampula roubou-nos (e tanto nos deu!) um tempo da viagem. Sentíamos que estávamos de férias (e estávamos a precisar de férias das férias!) em casa de amigos daqueles que já não vemos há muito, de tal maneira forte ficou a nossa relação. O João andava para trás e para a frente a tratar da sua papelaria que se estava a montar na garagem – e o Zé com ele; eu e a Sara conversávamos entre correrias do Zahir e da Maura. Entretanto batíamos as capelinhas dos costureiros, já que tínhamos quatro a trabalhar para nós, a fazer calças, camisas, saias, malas, baínhas… de capulanas que comprávamos pela cidade.
Foram uns vinte dias que lá estivemos, de boa conversa, vinhaças e cervejolas, e petiscos portugueses e moçambicanos – matapas de camarão e caranguejo, presuntos, queijos e uns chouriços… Bons amigos também. Uma, a Maria Júlia, nasceu enquanto lá estávamos, filha do Quiquicas (de nome Eqwiqwi!) e da Arminda. Ah, um pic nic nos montes Nairucu e a festa de anos da Inez! E a festa do dia da criança num jardim de infância, onde a Sara foi fazer de palhaço, voluntariamente, para publicitar a sua nova empresa de animação de festas… Um fartote. Txi, pessoal maningue nice…
Mas a realidade estava à espreita e tínhamos que deixar aquele ninho. Comprámos o bilhete de avião a partir de Nairobi, Quénia, o que queria dizer que tínhamos uns quantos dias de viagem para norte além do último destino a visitar, a imperdível Ilha de Moçambique.

A Mafalda, que tínhamos conhecido em Maputo, está lá a trabalhar no Museu. É uma bacana de primeiríssima e vive recentemente numa casa deliciosa, com um pátio interno com um jardim verde e cheio. Além disso, o dono da casa mimou-a como a um museu. Há bolas de canhão, lanternas de navios e todo o tipo de peças de arte africanas.
Logo no primeiro dia fomos de barco por ali a fora, num daqueles à vela (que valor não ter o barulho do motor!) para a ilha de Sete Paus, passar um dia na praia. Hmmm. Azul translúcido, areia branca, e coral e conchas e búzios grandes, tão grandes quanto se pode imaginar uma praia a que quase ninguém vai.
Além disso a Mafalda levou-nos a conhecer a malta lá da Ilha. No Ruby Backpackers (da Cláudia e do Uwe) vimos filmes projectados num terraço branco com almofadas de capulana; no jogo entre Portugal e a Costa do Marfim estávamos numa tasca moçambicana a beber cerveja Manica e à espera de uns pastéis de peixe; provámos matapa de Siri Siri, uma planta tenrinha que se apanha no mangal e o Vasco (que tem lá com a namorada Carolina um projecto educativo) levou-nos numa viagem pela ilha, onde se percebe a Cidade de Pedra e Cal e a Cidade do Macuti – os edifícios imponentes de um lado e as casas locais, de matope e folhas de côco entrançadas.
Foram uns belos dias. Lá tínhamos que partir. Aguardavam-nos uns 2000 quilómetros por estradas sabe-se-lá-como, que tanto podiam ser de terra batida, ou estar cheias de buracos, ou outra coisa qualquer que não imaginamos, além de duas passagens por fronteiras e dependência de boleias, ou pior, de transportes públicos.

E não é que tivemos sorte outra vez? =)
No cruzamento estivemos rés-vés-campo-de-ourique para apanhar um chapa, onde pelo menos, na nossa viagem interminável, avançávamos 140 quilómetros. Mas foi a velhinha história. Entra-se e o chapa não está suficientemente cheio (!!!) então vai-se dar uma volta e torna-se ao mesmo sítio. Quando o motor volta a roncar, afinal não há gasóleo e dá-se a mesma volta e torna-se ao mesmo sítio. E espera-se. Porque além das sacas, das galinhas, das crianças e do pessoal amontoado, o chapa não está suficientemente cheio. Pois para nós chegou de filmes destes. Desistimos. Por 140 quilómetros que se lixe. Há de vir melhor. A nossa fé era o tal camião confortável, ninho de milhas e milhas. Além disso saberia qual o melhor sítio para passar a fronteira. Mas a sorte acabou por nos sair maior.
Numa daquelas tentativas de pedir boleia parou um senhor, com um senhor chinoca no lugar do morto e outra senhora atrás. A senhora era uma passageira como nós e o senhor que guiava era um motorista do Sr. Chinês que afinal era vietnamita. O nosso destino útimo era Nairobi, mas se dividissemos a viagem por três troços o primeiro destino era Mueda, perto da fronteira com a Tanzânia e o segundo Dar es Salaam. Eles íam para Dar!! Sorte sorte. Até porque, como temíamos, as estradas eram más de mais (e vimos raros chapas)… Uns 300 quilómetros foram por terra batida, metade dela mesmo mesmo má. Acabámos por demorar mais um dia do que o previsto mas adorámos, tivemos o nosso verdadeiro primeiro contacto com a cultura oriental. Na primeira noite dormimos numa pensão em Mueda. Mas na segunda noite, a 300 quilómetros de Dar, com as estradas dali para a frente das piores que apanhámos, o Sr. Bihn, que falava pouco mas que era muito amoroso e com um daqueles sorrisos sinceros, entrou connosco para um lugar aberto entre árvores, onde gente sentada à fogueira via um jogo do mundial. O Zé, coitado, assustou-se mesmo. Tava a dormir a quando acordou estava um homem com uma catana na mão a indicar o estacionamento. LOL. Era uma das serrações do Sr. Bihn (chegámos ainda a conhecer outra, onde almoçámos no dia seguinte, com pauzinhos e tudo) onde fomos acolhidos como convidados de honra, jantámos caranguejos inteiros e sopas chinocas e arroz lá à moda deles (bem bom!). Depois montámos a tenda e de manhã, a beber um inexperado e Delicioso café vietnamita (!) fartámo-nos de conversar com dois cambojanos que lá trabalhavam. Gente doce e sorridente como nunca vimos. Saímos, ainda tínhamos duros quilómetros que papar, com um sorriso bem feliz na cara.

E lá chegámos a Dar es Salaam. Só tínhamos um dia para passear e ver tudo (e não vimos nada – escrevo agora com os pés doridos e com mais umas quantas tralhas para carregar); mas adorámos esta cidade arabo-africana, com chamussas deliciosas, com as gentes misturadas e com turismo a mais (só nos querem chular com o preço do branco). Agora vou jantar qualquer coisa indiana e picante.
Até breve!!

Dar es Salaam





Ilha de Mocambique








Ilha de Mocambique











Companheiros de Nampula - a nossa familia Macua








Malawi e Costureiros








Tete

Província de Tete. Onde os pés e os ombros começaram a ficar doridos…

A paisagem é um encanto. Seca e poeirenta, de rios de areia entre ela, com montanhas que separam Moçambique do Zimbawe a oeste, e mais a norte as montanhas por onde serpenteia o Zambeze, interrompido por Cahora Bassa.
Diz a lenda que o embomdeiro era a árvore maior criada por deus. Por isso mesmo passava noite e dia a vangloriar-se da sua sorte e da pequenez dodas as outras árvores. Deus, quando soube da sua vaidade, enfureceu. Agarrou no embondeiro e virou-o de cabeça para baixo. Daí, hoje, estarem as suas raízes ao vento.

A cidade é uma cidade cara, onde pessoal de todo o mundo corre à procura do ouro negro daqui, o carvão. A vida é intensa na cidade, e de todas as cores. Encontrámos quem nos arranjasse o telemóvel, bebemos uma bica portuguesa, conhecemos o bacano do Sam que nos deixou ficar em casa dele uma noite e partimos para Songo, para a albufeira. Revistados numa vez num ponto de controle, quase uma outra na esquadra onde pedimos informações e uma outra quase terceira vez que não aconteceu porque não estávamos com as mochilas, mas que nos chatearam até à morte e nos queriam fazer sentar. Coitados, estavam aborrecidos. Raio de polícia em tete, a pior de Moçambique.

Ficámos no Ugezi Tiger Lodge. Á barragem só se podia ir com uma semana de marcação mas sem mal, porque o rio impressona mais do que aquilo que o tenta deter. As montanhas estavam de todas as cores (bem sei que deveria ser normal, visto ser outono aqui, mas já ouvi que aqui as cores encarniçadas são na primavera, nos novos rebentos antes de passarem para verde), embondeiros por ali acima, uma espécie de plátano, mas de tronco branco e folhas amarelas, de cenário… Esquilos, passarinhos e passarinhos, e já umas quantas palhotas de gente que se tinha estabelecido ali, mas pouca. Com este chegámos a um terceiro ponto-chave do rio Zambeze. Já tínhamos estado nas Victoria Falls, depois no enorme delta e agora na barragem de Cahora Bassa.

O Lodge saiu-nos caro afinal. Estava mal-gerido, era caro e mal servido. Mas bonito, bem bonito, enfiadas nas pedras as casinhas que se alugavam no pequeno caminho que ía dar à albufeira. Na zona dos barcos vimos varanos pequenos e crocodilos de 30 cms a apanhar banhos de sol.
Mas voltámos para Tete. A parte económica começa a ter que ser repensada. Estamos cansados e não tínhamos tido muitas sortes. Mas por sorte, ou necessidade, ou destino, vimos um senhor na rua a vender plantinhas e plantecas, com frascos com todo o tipo de coisas e cores lá dentro, picos de porco-espinho, e outras coisas meio inomináveis. Sempre curiosos. Acabámos por comprar (e não foi impingido, o senhor estava tão ou mais curioso com a nossa curiosidade do que ela mesma) uns ramos secos, “morre vive” ou “morte vida” ou assim – mas em dialecto – que se punham em água, para lavar a cara no dia a seguir (conforme a gravidade do problema podia tomar-se banho), já que cheiravam bem e abriam na água nessa noite, não parecendo estar mortas afinal, mas bem vivas, só secas. Pois demorámos pôr a planta de molho, e todos os dias nos arrependíamos, a sorte ía de mal a pior, umas discussões, umas indecisões… Mas finalmente lá pusémos. Estávamos em Massinga, já meio precipitados a sair do Malawi (só conhecemos a cidade de Blantyre, a sul) onde entretanto tínhamos ido com intuíto de conhecer mas especialmente para ter outro visto. E não é que até foi engraçada a sorte que a plantinha nos deu? Seja mito, o que é que interessa?

Porque neste momento estamos em casa da Sara e do João, dois tugas, boa gente do melhor, que conhecemos aqui em Nampula
(onde chegámos depois de um dia das 5 da manhã às 9 da noite em transportes, num camião com sacas e galinhas e muita gente, eu quase a cair, o Zé a olhar para a sua mochila cheia de caca de galinhas assustadas; mas depois numa santa boleia, de carro, à larga…)
Mas estamos agora em Nampula, conhecemos este pessoal que nos convidou a jantar e depois a ficar. Escrevo duma varanda no calor do inverno, onde oiço o Zahir (com um ano) que estava contente a agarrar uma largatixa de rabo azul, música de jambés – e espero pelo Zé, que foi comprar com o João umas madeiras para o balcão da papelaria que se vai construir, mas que entretanto ficaram na conversa com mais um polícia aborrecido. Lol.

E saudades. Talvez o nosso regresso se avizinhe, já temos umas quantas ideias para desenvolver aí… ***

Tete










Tete